sexta-feira, 29 de abril de 2016

Movimentos de feministas e prostitutas defendem a regulamentação da prostituição


 
O Seminário Nacional Saúde nas Esquinas que reuniu prostitutas e feministas em Florianópolis/SC, lançou em sua plenária final, a Carta Santa Catarina que marca a união de movimentos em defesa dos direitos das mulheres transgêneros, travestis e prostitutas. Na carta, a Rede Brasileira de Prostitutas e a Rede Feminista de Saúde, realizadoras do encontro, pedem a garantia da inclusão de prostitutas, mulheres travestis e mulheres trans em todos os locais de discussão, assim como a instalação nacional de um debate público para a defesa da regulamentação da prostituição como trabalho. 


O encontro também foi de planejamento da Campanha Nacional de Educação e Saúde na Prostituição – Saúde nas Esquinas.
 
O documento assinado por várias instituições diz que a discriminação histórica contra as pessoas que exercem a profissão não pode ser um entrave para a garantia de direitos e revela o pouco avanço dos movimentos feministas na discussão sobre a realidade dessas profissionais. “Não cumprimos mais do que a nossa obrigação em apoiar a autonomia das mulheres”, afirma Télia Negrão, representante da Rede Feminista de Saúde na regional do Rio Grande do Sul.
 
Luana de Jesus do Instituto Estrela Guia de Florianópolis avalia que o encontro marca a entrada das mulheres transgêneros, travestis e prostitutas no movimento feminista depois de tentativas de aproximação. “É um ganho para todas nós. As travestis sofrem mais machismo do que as mulheres cisgêneros em função da transfobia que é a não aceitação de um corpo masculino ‘transformado’ em feminino”, assinalou a travesti.
 
Débora Le do Grupo Renascer de Apoio aos Homossexuais acredita que esse é um primeiro passo para a integração de travestis, trans e “toda a população que vive em vulnerabilidade” ao movimento feminista. “Firmamos uma aliança que fortalece a luta contra a discriminação. Eu penso como mulher e sofro tanto quanto uma mulher”, conta. Ela começou a se prostituir com 13 anos e há três abandonou o trabalho para se dedicar a um programa da prefeitura de Ponta Grossa/PR de apoio às travestis. Débora é casada com uma mulher há 27 anos e tem uma filha de 24.

Monique Prada

Monique Prada, uma das fundadoras da Central Única das Trabalhadoras e Trabalhadores Sexuais (CUTS), criada em 2015, diz que a abertura do diálogo é positiva, no entanto não concorda com a separação que se faz entre prostitutas e feministas. “Nós também somos feministas. Eu já me declarei como tal e embora algumas prostitutas não se declarem, elas têm atitudes feministas”, afirma.
 
A feminista Rayane Noronha Oliveira, da regional da Rede Feminista de Saúde em Brasília, acredita que o diálogo aberto nesse encontro histórico resulta numa parceria e participação conjunta na discussão de políticas públicas que respondam às necessidades de diferenças no trato e demandas específicas. “Essa união atenta para a multiplicidade dos corpos considerados abjetos, marginalizados. As mulheres transgêneros, travestis e prostitutas também sofrem com o machismo. É bom conversar e ouvi-las falar ‘sou feminista'”, afirma Rayane.

Rayane Noronha Oliveira
 
Para a representante, a inclusão das mulheres transgêneros, travestis e prostitutas deve-se à visão de que a prostituição está ligada ao capitalismo e seu modelo patriarcal, porém negá-la só tende a reforçar o machismo que se manifesta na discriminação e no não reconhecimento de direitos. “Não se trata de uma visão romantizada, mas de defender a autonomia das mulheres e suas necessidades cotidianas. A exploração existe em todas as profissões dentro do sistema capitalista”, afirma.
 
Clair Castilhos e Télia Negrão
 
No encerramento do Seminário, Clair Castilhos, secretária executiva da Rede Feminista de Saúde, falou do pioneirismo do encontro por oportunizar “debates aprofundados” sobre as diferentes questões que envolvem as militâncias e a participação das prostitutas e feministas na sociedade como um todo. “Conseguimos estabelecer pontos de consenso entre as lutas e de identidades entre as diferentes discriminações e violências das quais somos alvos na sociedade. Manifestamos o profundo desejo de que possamos nos encontrar mais vezes para continuar passo a passo o avanço das nossas lutas que se somam à luta pela defesa dos direitos democráticos”, afirma Clair.

 
CARTA DE SANTA CATARINA
Reafirmamos os compromissos com os direitos humanos de todas as mulheres, a sua cidadania e a garantia da assistência integral dos direitos sexuais e direitos reprodutivos.
 
As organizações presentes no Seminário Nacional sobre Qualidade de Vida e Redução de Riscos à Saúde no Exercício da Prostituição – Saúde nas Esquinas, organizado pela Casa da Mulher Catarina, realizado pela Rede Nacional Feminista de Saúde em parceria com a Rede Brasileira de Prostitutas entre os dias 7 e 10 de abril de 2016 em Florianópolis, vêm a público expressar que:
 
Os preconceitos e as discriminações que historicamente envolvem as pessoas que exercem a prostituição têm sido empecilhos para a garantia de direitos em todas as políticas públicas;
 
Os movimentos de mulheres e os movimentos feministas ainda têm pouco avanço na discussão sobre a realidade vivida na prostituição e quase nenhuma aproximação com os movimentos organizados das pessoas que exercem a prostituição;
 
O atual cenário conservador que se expressa pela violação de direitos já adquiridos, como também impedindo o avanço da luta contra as desigualdades, não nos intimida em manifestar publicamente nossos posicionamentos a favor da garantia de direitos.
 
Por isso afirmamos que é fundamental:
 
Garantir para todas as pessoas que exercem a prostituição, o acesso e o gozo dos direitos em todas as políticas públicas com integralidade;
Garantir a inclusão de prostitutas, mulheres travestis e mulheres transexuais em todos os locais de debates, tais como: conferencias, seminários, workshops de políticas para mulheres em nível municipais, estaduais e nacional;
Que se instale nacionalmente um debate público para a defesa da regulamentação da prostituição como trabalho.
 
CONCLAMAMOS os demais movimentos de mulheres, feministas e sociais a colocarem em suas pautas e agendas políticas a defesa dos direitos das pessoas que exercem a prostituição e das mulheres travestis e transexuais, fortalecendo os seus movimentos e seu protagonismo.
 
Assinam:
Casa da Mulher Catarina
Rede Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
Rede Brasileira de Prostitutas
Central Única de Trabalhadoras e Trabalhadores Sexuais
Rede Nacional de Pessoas Trans
Instituto Nice de Apoio às Mulheres Travestis e Mulheres Transexuais
Associação Nacional de Travestis e Transexuais
Rede Gapas
Gapa SC
Unegro
Coletivo Feminino Plural
Estrela Guia
Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS
Coletivo Catarinas
Fórum de Mulheres da Amazônia Paraense
Coletivo Cultural Urbano Simbiose
União Brasileira de Mulheres – UBM
COMDIM – Florianópolis
Sempre Mulher – Instituto sobre Relações Raciais
Instituto de Estudos de Gênero – IEG Florianópolis
Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo – PM DST/AIDS
Rede Mulheres Negras do Paraná
Coletivo Feminista Casa da Mãe Joana (Blumenau/SC)
Movimento de Lésbicas e Mulheres Bissexuais da Bahia
Coordenadoria Municipal de Políticas para as Mulheres de Florianópolis
Associação de Prostitutas do Piauí – Aprospi
Transgrupo Marcela Prado – Curitiba – PR
Grupo Renascer – Ponta Grossa – PR
MundoInvisivel.org
Capitulo Brasileiro da ICW Latina – ICW Brasil
COMDIM Porto Belo/SC
Associação Ilê Mulher

Fonte: http://redesaude.org.br/

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