segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

A seca e o olhar sudestino - Roberto Malvezzi

A seca e o olhar sudestino - Roberto Malvezzi

Quarta-feira, 23 de janeiro de 2013 - 15h55min
por Roberto Malvezzi
É duro ver as reportagens feitas pelos grandes meios de comunicação do sul e sudeste sobre nossa região, particularmente em tempos de longa estiagem. O comentário é de Roberto Malvezzi em artigo no Brasil de Fato, 22-01-2013.

Eis o artigo.

O pior da seca parece estar terminando, mas não terminou. Ainda haverá sofrimentos em 2013, menos água em muitos lugares, pastagem mais escassa, safra prejudicada. Mas, a tendência é a situação melhorar daqui para frente, voltando a longa estiagem lá pelo ano de 2050, daqui a trinta anos.

Não se repetiu a tragédia humana das grandes migrações e do genocídio humano. A lógica da convivência com o semiárido provou ser a mais correta e a tragédia só não se repetiu graças a pouca infraestrutura já implementada, como cisternas e algumas adutoras.

É duro ver as reportagens feitas pelos grandes meios de comunicação do sul e sudeste sobre nossa região, particularmente em tempos de longa estiagem. O imaginário preconcebido sempre está presente.

Elas têm enfatizado a morte dos animais. De fato, o gado bovino tem sofrido e morrido em quantidade nessa seca. Mas, essa é uma questão superada para o movimento social que defende a convivência com o semiárido, isto é, essa região nunca foi local adequado para se criar bois e vacas. Há uma comparação feita pelos educadores populares nos cursos de formação com uma estatística bem simples: um boi come por sete bodes, bebe por sete bodes, ocupa o espaço de sete bodes. Quando morre um boi, morre o equivalente a sete bodes.

De fato, quando se encontrar um bode morto de fome ou sede no sertão, é porque ali já não sobrou uma alma viva. Nessa seca os bois estão morrendo, os bodes estão gordos. O animal é adaptado, suporta as secas, mesmo que sua criação seja contestada por muitos técnicos como sendo um animal daninho e ameaçador da biodiversidade. Mas isso – dizem os técnicos do movimento social – é um problema de manejo, não de adaptação.

Além do mais, os repórteres têm se dirigido exclusivamente ao sertão de Pernambuco, particularmente aos eixos da Transposição. Muitos insinuam: se a obra estivesse concluída, não haveria esse sofrimento. Mentira absurda. Os lugares visitados, como Cabrobó, estão às margens do São Francisco. Água é o que não falta para abastecer o sertão de Pernambuco. O problema continua sendo sua distribuição.

Ao seu modo o governo começa fazer as adutoras, tão reivindicadas por nós. A do Algodão em Guanambi; do Pajeú, em Pernambuco; do São Francisco para Aracaju; do Forró no sertão de Curaçá; do Cristal no sertão de Petrolina; as duas de Remanso; etc. Portanto, o governo sabe o que é correto fazer.

Quanto à Transposição, tudo que prevíamos acontece: impacto nas comunidades, impacto no meio ambiente, prazos alongados, preços duplicados. Um fator não previmos: os projetos mal feitos e agora condenados pelos Tribunal de Contas da União.

Se a obra vai chegar ao fim não sabemos. Só lá poderemos confirmar nossas outras previsões, as mais cruéis: a água não é para o povo necessitado; vai impactar o São Francisco - que esse ano já está apenas com 27% em Sobradinho-; finalmente, não vai resolver o problema da seca.
Quem viver verá. O tempo é o pai da verdade.

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